Quando somos crianças, nossos sofrimentos costumam ser dissolvidos pelo afeto dos nossos pais; pois, neles, encontramos um abrigo que compreende e abarca a totalidade de nosso cosmos. No entanto, a nossa infância não é eterna, precisamos amadurecer e enfrentar a vida adulta.
E ao enfrentar a vida adulta nos deparamos com o sofrimento, assim como nos deparamos com ele na infância. Agora nossos pais não são mais a totalidade do nosso cosmos, claro que sempre serão uma parte fundamental dele, mas não o preenchem totalmente. Cabe a nós escolhermos qual será o centro de nosso cosmos na vida adulta, dessa escolha depende o saber lidar de maneira correta com o sofrimento.
O que os pais são para nós na impotência de nossa infância, Deus o é na impotência da nossa vida adulta. Vejam, não estou dizendo que nossos pais são como deuses para nós na infância, ou que uma criança não é capaz de ter Deus como o centro de sua vida, mas o que quero demonstrar é que, na maioria das pessoas, os pais abarcam a totalidade do nosso cosmos em formação.
Pois bem, como puderam perceber o único capaz de preencher e dar sentido ao nosso cosmos é Deus. Nós desejamos o infinito, e só Ele É infinito; desejamos algo que não se esvaia com o tempo, e só Ele É eterno.
Dessa maneira, só aprenderemos a lidar com o sofrimento a partir do momento que colocarmos Deus como centro de nossas vidas. Mas fica a pergunta: “O que é o saber sofrer?”
Tomás de Kempis, no seu Imitação de Cristo, diz:
1. Jesus: Filho, que é o que estás dizendo? Deixa de te queixar, em vista da minha paixão e dos sofrimentos dos santos. Ainda não tens resistido até derramar sangue. Pouco é o que sofres em comparação do muito que padeceram eles em tão fortes tentações, tão graves tribulações, tão várias provações e angústias. Convém, pois que te lembres dos graves trabalhos dos outros, para que mais facilmente sofras os teus, que são mais leves. E se te não parecem tão leves, olha, não venha isso de tua impaciência. Contudo, sejam graves ou leves, procura levá-los todos com paciência.
KEMPIS, 64-65
2. Quanto melhor te dispões para padecer, tanto mais paciente serás em tuas ações e maiores merecimentos ganharás; com a resignação e a prática torna-se também mais suave o sofrimento. Não digas: não posso sofrer isto daquele homem, nem estou para aturar tais coisas, pois me fez grave injúria e me acusa de coisas que jamais imaginei; de outros sofreria facilmente, quanto julgasse que devia sofrer. Insensato é semelhante pensar, pois não
considera a virtude da paciência nem olha àquele que há de coroála, mas só atende às pessoas e às ofensas recebidas.
3. Não é verdadeiro sofredor quem só quer sofrer quanto lhe parece e de quem lhe apraz. O verdadeiro paciente também não repara em quem exercita a paciência; se for seu superior, ou igual, ou inferior, se for homem bom e santo, ou mau e perverso. Mas, sem diferença de pessoa, sempre que lhe sucede qualquer adversidade, aceita-a gratamente da mão de Deus e a considera um grande lucro para sua alma. Porque aos olhos de Deus qualquer coisa, por insignificante que seja, que soframos por amor dele terá seu merecimento.
4. Aparelha-te, pois, para o combate, se queres a vitória. Sem peleja não podes chegar à coroa da vitória. Se não queres sofrer, renuncia à coroa; mas, se desejas ser coroado, luta varonilmente e sofre com paciência. Sem trabalho não se consegue o descanso e sem combate não se alcança a vitória.
5. A alma: Tornai-me, Senhor, possível, pela graça, o que me parece impossível pela natureza. Vós bem sabeis quão pouco sei sofrer, e que logo fico desanimado com a menor contrariedade. Tornai-me amável e desejável qualquer prova e aflição, por vosso amor, porque o padecer e penar por vós é muito proveitoso à minha alma.
Percebe-se que temos nos santos os exemplos de sabedoria do sofrimento, são exemplos como o de São Maximiliano Maria Kolbe, Santa Teresinha, Santa Rosa de Lima, Santa Edith Stein, a história de Jó como narrada nas Sagradas Escrituras. Além destes, temos Aquele que É Santo por excelência, Nosso Senhor Jesus Cristo que, nas palavras de São Paulo, “Sendo ele de condição divina, não se prevaleceu de sua igualdade com Deus, mas aniquilou-se a si mesmo, assumindo a condição de escravo e assemelhando-se aos homens. E, sendo exteriormente reconhecido como homem, humilhou-se ainda mais, tornando-se obediente até a morte, e morte de cruz.” (Fl 2, 6-8).
Então saibamos sofrer, entreguemos tudo a Nosso Senhor. Coloquemo-No como o Centro, pois sabemos que Ele É o único necessário e o único capaz de acabar com nossas mesquinhas inquietações.
Salve Maria.
Referências:
Imitação de Cristo
Sagradas Escrituras