A Igreja nunca professou o pacifismo.
O combate cristão, que é acima de tudo, uma atitude espiritual, mas que inclui a possibilidade da legítima defesa, a guerra justa e até mesmo “a guerra santa”, pertence a mais pura tradição católica.
Quem professa o pacifismo e o ecumenismo até o último ponto esquece que há males mais profundos que os físicos e materiais, e confunde as conseqüências desastrosas da guerra no plano físico, com suas causas, que são morais e provêm da violação da ordem. Numa palavra, olvidam que o pecado que só pode ser derrotado pela Cruz.
O mundo moderno que está imerso no hedonismo e perdeu a fé julga só ser um mal, e um mal absoluto, os danos físicos, esquecendo que o mal e a dor que acompanham inevitavelmente a vida humana com freqüência a elevam.
O espírito das Cruzadas e de Lepanto nos envia uma mensagem de fortaleza cristã que consiste na disposição de sacrificar os bens da terra, em aras de bens maiores, como a justiça, a verdade e o futuro de nossa civilização.
Hoje, o inimigo que ameaça a Igreja e o Ocidente é a atitude mental de quem acredita que acabou o tempo de Lepanto e das Cruzadas.
Esse inimigo contrapõe ao espírito de combate uma visão do mundo segundo a qual nada há de verdadeiro e de absoluto, e que tudo é relativo às épocas, aos lugares e às circunstâncias.
É este o relativismo que foi denunciado por João Paulo II na Encíclica “Veritatis Splendor” e “Evangelium Vitae” quando fala da “confusão entre o bem e o mal, que torna impossível construir e manter a ordem moral dos indivíduos e das comunidades” (SV 93).
A batalha contra o relativismo em defesa das raízes cristãs da sociedade para a qual hoje nos convidam João Paulo II e Bento XVI, é uma batalha em defesa de nossa memória histórica.
Sem memória histórica não há identidade no presente, porque é sobre a memória que se baseia a identidade dos indivíduos e dos povos.
Mas, as raízes cristãs não pertencem só à memória ou à história: elas estão vivas, porque o Crucifixo que as resume não é somente um símbolo histórico e cultural, mas é uma fonte atual e perene da verdade e da vida, do sofrimento e da luta.
A Igreja tem inimigos ainda que nós tendamos a esquecê-lo porque perdemos a concepção militante da vida cristã, fundada na Cruz, que sempre caracterizou o cristianismo.
A perda desse espírito militante é o resultado do hedonismo e do relativismo em que estão imersos, infelizmente, muitos homens de igreja.
Bento XVI fala freqüentemente de “minorias criativas”, poderíamos acrescentar “militantes”, porque a guerra hoje em curso é moral e cultural. Nela se enfrentam em línea de princípio duas concepções do mundo.
A história, aliás, é feita pelas minorias, sobre tudo as militantes. Pode-se militar pelo bem ou pelo mal, em um campo ou outro, mas apenas os militantes deixam sua marca nos eventos históricos.
Na homilia de 5 de junho de 2010, em Nicósia, Bento XVI sublinhou também que “um mundo sem a Cruz seria um mundo sem esperança.”
O mesmo pode ser dito de um mundo sem espírito de Cruzada: seria um mundo sem esperança.
Isso significaria a renúncia à luta pela salvação, a renúncia da Cruz e reduzir o mundo a meras ruínas.
Prof. Roberto de Mattei, “Il Foglio”, 08/06/2010, apud Corrispondenza Romana, 08/06/ 2010