O Santo Rosário é uma devoção verdadeiramente sublime. É necessário que medites essa realidade sob os mais diversos ângulos possíveis, pois só uma devoção há que possa agradar mais o coração da Virgem Maria, que é a devoção ao Santíssimo Sacramento.
Esse é o primeiro ponto a ser meditado. A Igreja existe para que o sacrifício da Cruz possa ser atualizado na Santa Missa a fim de alcançar para o mundo pecador a misericórdia de Deus e dar aos fiéis acesso ao Autor da Graça, que é Jesus Cristo, em um verdadeiro ato místico de união com Deus, que é a comunhão sacramental. Na fila da comunhão, somos como que mendigos desprezíveis esperando para receber a ração diária das mãos de um benfeitor. A nossa condição pelo pecado é a total miséria. Não fosse por Cristo, o que seria de nós?
Estando no Santíssimo Sacramento o próprio Autor da Graça, que outra devoção poderia ser mais agradável a Deus e a sua Mãe Santíssima do que aquela que se tem ao Santíssimo Sacramento? Diante do Santíssimo Sacramento, Maria Santíssima se prostra e rende adoração perfeita; contempla ali a Carne de sua carne, o Sangue de seu sangue, mas também contempla a Alma humana perfeitíssima de Cristo que pelo Pai foi criada e a Santa Divindade que é por toda a eternidade.
A grande Graça que a Mãe Santíssima quer comunicar aos seus filhos é a devoção ao Santíssimo Sacramento. Tanto mais ama a Jesus Cristo aquele que cresce em amor à Virgem Santíssima; nada pode agradar mais à Mãe do que ver o Filho sendo verdadeiramente adorado.
Como segundo ponto, podes perceber como a récita do Santo Rosário significa rezar com as palavras do próprio Deus. O Santo Rosário é composto essencialmente de três orações vocais: A Oração do Senhor, a Saudação Angélica e o Glória.
A Oração do Senhor é aquele que foi ditada pelo próprio Deus por meio da humanidade de Cristo, a segunda pessoa da Santíssima Trindade. Nela estão contidos o fim último do homem, a síntese da vida moral e os pedidos que devemos fazer a Deus. É oração de perfeita humildade, pois retrata a grandeza de Deus e a impotência do homem. É, em suma, oração perfeita em todos os sentidos, da qual a Igreja extrai toda a doutrina sobre a oração cristã.
São João Crisóstomo disse certa vez que “aquele que não ora como o Divino Mestre orou e ensinou a orar não é seu discípulo; Deus Pai não se agrada em ouvir as orações que o espírito humano formou, mas exatamente aquelas que seu Filho nos ensinou”. Isso não quer dizer que não possamos formular preces e Deus com nossas próprias palavras, mas sim que jamais devemos desprezar a supremacia da oração que nos foi ensinada por Cristo. As orações vocais ensinadas pela Santa Igreja (que é antes divina que humana) devem ser sempre o selo que sucede nossas preces íntimas; são como que uma garantia de que seremos ouvidos por Deus em nossos pedidos e que nossos louvores e ações de graças serão por Ele aceitos.
É por isso que é sempre bom terminarmos nossas preces com um Pai-Nosso e uma Ave-Maria.
S. Luís de Montfort ensina que ao recitar a Oração do Senhor, deve o fiel ater-se maximamente ao significado das palavras ali contidas. A Oração do Senhor é como que uma síntese do Evangelho, de modo que bem rezada conduz a uma apropriação singular de todo o mistério da redenção humana.
A Saudação Angélica é aquela que foi revelada pelo Divino Espírito Santo. É um perfeito ato de louvor e veneração à Santíssima Virgem, Mãe de Nosso Senhor Jesus Cristo. Ao aparecer para a Virgem Maria em Nazaré, o Mensageiro de Deus lhe disse:
— Alegra-te, cheia de graça! O Senhor é contigo!
Tendo aceitado o desígnio de Deus e oferecido-se a Si mesma para Mãe do Divino Verbo, Maria Santíssima foi outra vez glorificada pelo Espírito Santo, dessa vez por boca de Santa Isabel, a qual exclamou em voz forte ao ouvir a saudação da Imaculada:
— Bendita és tu entre as mulheres e bendito é o fruto do teu ventre!
Tudo aquilo que podemos dizer à Santíssima Virgem, por mais santo, piedoso e por Deus inspirado que seja, não pode sobrepujar em valor o que o próprio Deus disse quando era Ela ainda a pobre virgem de Nazaré. Hoje, louvamos e bendizemos a Virgem Maria enquanto Rainha do Céu e da Terra, grande em poder e majestade, depositária de todas as Graças de Deus. No entanto, lá Ela foi louvada por Deus em sua humildade, pobreza, simplicidade e ignorância. Não teríamos também nós ignorado com todos os demais transeuntes a humilde virgem que por nós passou no caminho das regiões montanhosas da Judéia carregando em seu ventre o Divino Salvador?
Diferentemente do que ocorre com o Pai-Nosso, não é de todo necessário que as Ave-Marias sejam recitadas com máxima concentração no significado das palavras enquanto se reza o Santo Rosário.
Digo isso porque existem pessoas que preferem meditar os mistérios ao longo das Ave-Marias, e isso não pode ser feito sem prejuízo da atenção no significado das palavras. Não há qualquer problema em rezar desse modo, pois é intenção da Santíssima Virgem Maria que na récita dessas preces meditemos com a simplicidade típica das almas pobres os mistérios de nossa redenção. As Ave-Marias compõem como que uma música de fundo para a meditação, e os frutos que disso se colhe são sublimes.
Existem outras pessoas que, dispondo de mais tempo, optam por meditar o mistério proposto antes de iniciar a dezena. Nesse caso, ao recitarem as Ave-Marias, devem ater-se mais ao significado das palavras, a fim de que a imaginação não perturbe o recolhimento.
A récita das Ave-Marias costuma ser o momento de maior dispersão na oração do Santo Rosário, pois temos dificuldades para concentrarmo-nos no mesmo objeto por um período mais prolongado. Há, portanto, um método que consiste em inserir pequenas cláusulas em meio às Ave-Marias para auxiliar no foco da meditação. É assim que ao meditar o mistério da ressurreição, reza-se da seguinte maneira:
— Ave Maria, cheia de graça, o Senhor é convosco. Bendita sois vós entre as mulheres e bendito é o fruto do vosso ventre, Jesus, que ressuscitou dentre os mortos. Santa Maria, Mãe de Deus…
Podes encontrar as cláusulas em vários sites da internet. Há inclusive Rosários que são rezados tendo uma cláusula diferente por Ave-Maria, a fim de auxiliar mais ainda na concentração e proporcionar uma meditação linear ao longo da dezena. Nada impede, no entanto, que formules tuas próprias cláusulas. Na verdade, é bem simples fazê-lo. Usemos, a título de exemplo, os mistérios gloriosos. Eu mesmo formularei cinco cláusulas:
1º Mistério (ressurreição): “[…] Jesus, que ressuscitou ao terceiro dia […]”.
2º Mistério (ascensão): “[…] Jesus, que subiu ao Céu […]”.
3º Mistério (pentecostes): “[…] Jesus, que enviou o Espírito Santo […]”.
4º Mistério (assunção de Nossa Senhora): “[…] Jesus, que vos elevou ao Céu […]”.
5º Mistério (coroação de Nossa Senhora): “[…] Jesus, que vos coroou de glória […]”.
Viu como é fácil? Recomendo-te que testes conforme a necessidade, e não me importaria que te valesses ora de um modo ora de outro como uma “quebra de rotina”, se fores do tipo de pessoa que disso necessita para manter a constância. O importante é que não pares.
O Glória, por sua vez, assinala de modo preciso o fim para o qual todas essas coisas existem, que é a Glória de Deus, Deus que é Pai, Filho e Espírito Santo, aquele era, que é e que há de vir. Nada é digno de Deus senão sua própria Glória. Sendo o ser em essência, sumamente perfeito, adorável, amável, belo, verdadeiro, sem qualquer nódoa, totalmente auto-suficiente, assustadoramente poderoso, não lhe seria próprio existir e agir para nada que não fosse sua própria Glória. Nós, miseráveis criaturas, reconhecendo isso e gratos por sua bondade para conosco, exclamamos, pois:
— Glória ao Pai, ao Filho e ao Espírito Santo!
É nesse mesmo espírito que se propõe, no início do Santo Rosário, a oração de três Ave-Marias. A primeira delas para dar glória a Deus Pai; a segunda, a Deus Filho; a terceira, a Deus Espírito Santo.
Lembremos do que aconteceu quando Nossa Senhora adentrou em casa de Santa Isabel. Esta, ao ouvir a saudação da Santíssima Virgem, ficou cheia do Espírito Santo. São João Batista, o precursor, também ficou cheio do Espírito, dando um salto de alegria por estar na presença do Divino Redentor e de sua Mãe Santíssima.
Santa Isabel, tendo recebido a Graça do Espírito Santo, compreendeu pela virtude infusa da Fé o que se passava naquele momento. Compreendeu que lhe saudava a Santa Mãe de Deus, a que seria coroada Rainha do Céu e da Terra, e que já carregava em seu ventre puríssimo o Autor de toda a Graça. Não fazendo caso de sua condição nobre, pois era esposa de Zacarias, sacerdote do Altíssimo, integrante de casta privilegiado do povo de Israel, prostrou-se diante da Divina Mãe e perguntou com humildade:
— De onde me vem a honra de ser visitada pela Mãe de meu Senhor?
Ó, que sublime ato Fé! Estando impossibilitada de ver até mesmo a humanidade de Cristo oculta no seio de Maria, confessou Santa Isabel que ali estava o seu Deus! Não é essa a Fé que Deus espera de nós quando contemplamos a Eucaristia? Ali não vemos sequer a humanidade de Cristo, pois tudo está oculto, mas confessamos dizendo “meu Senhor e meu Deus!”.
Então Santa Isabel, que recebeu a Graça do Espírito Santo e o dom da Fé pelo mistério da visitação, louva e bendiz a Virgem Santíssima, que por seus méritos e por sua própria Fé mereceu que tudo aquilo acontecesse, e já iniciava desde então o sublime apostolado de distribuir a Graça de Deus pelo mundo:
— Bem-aventurada és tu que creste, pois se cumprirão todas as coisas que o Senhor te prometeu!
E o que faz a Santíssima Virgem ao presenciar todas essas coisas? Eleva o coração a Deus e diz:
— Minha alma glorifica ao Senhor, meu espírito exulta em Deus, meu Salvador! Pois olhou para a pobreza de sua escrava…
No mundo, só houve um que ofereceu a Deus prece mais sublime de entrega e abandono: Cristo Jesus. Mas o próprio Cristo, naquele sublime momento, rendia louvor e adoração perfeita ao Pai desde as entranhas de sua Mãe Santíssima. Ó, que sublime adoração! Foi ela tão perfeita que calou as vozes dos Céus, pois os anjos consideraram todos os seus louvores como nada diante da grandeza do que estava ali sendo a Deus oferecido por Jesus e Maria.
É assim, pois, que a cada Ave-Maria que rezas, a Virgem Santíssima entoa sua mais sublime ação de graças a Deus, de modo que já não sejas mais visto por Deus como o pecador que lhe rendeu um ato de louvor, mas sim como o filho amado que moveu o coração da Virgem Santíssima a prestar-lhe um culto perfeito. Que poderia agradar mais a Deus do que isso?
Já paraste para pensar por qual motivo a Igreja chama o saltério da Virgem Maria de Santo Rosário? Se o denominasse simplesmente por saltério de Nossa Senhora, entenderíamos perfeitamente. Mas… Santo Rosário?
S. Luís de Montfort explica que esse nome surgiu depois da restauração da devoção pelo Beato Alano de la Roche (1.428 – 1.475), tendo sido dado pelo próprio povo.
Como nota explicativa, diz-se restauração da devoção porque, após um século de recitação fervorosa do Santo Rosário, que iniciou com a revelação feita por Nossa Senhora a São Domingos de Gusmão, caiu a devoção no esquecimento, até que foi restaurada novamente pelo Beato Alano, o qual foi instruído em visões por Jesus e Maria e tornar-se um apóstolo do Santo Rosário.
Voltando ao nome, rosário significa coroa de rosas. Tal nome surgiu da crença comum do povo de que ao se recitar o saltério da Virgem Maria, estava a se coroar a Santíssima Virgem e seu Divino Filho com uma mística coroa de rosas que perdura por toda a eternidade.
Acredite se quiser, mas um religioso de nome Alfonso Rodriguez, da Companhia de Jesus, recitava o Santo Rosário com tamanho fervor que via sair de sua própria boca rosas de grande beleza e agradabilíssimo odor. A cada Pai-Nosso, via sair uma rosa vermelha; a cada Ave-Maria, uma branca.
Há nas crônicas de S. Francisco outro relato surpreendente. Um jovem muito devoto tinha por costume recitar a coroa de Nossa Senhora antes das refeições. Certo dia, deixou de fazê-lo. Tendo ouvido tocar o sino para se dirigir ao refeitório, foi ter com o superior para obter permissão de recitá-la antes de se sentar a mesa. Tendo obtido a permissão, dirigiu-se ao seu quarto a fim de fazê-lo. Como demorasse, ordenou o superior a outro irmão que fosse lhe chamar. O outro irmão, tendo se dirigido ao local em que estava o devoto, presenciou um fato surpreendente: Viu o corpo da alma devota envolto por uma luz celeste e junto dele a Santíssima Virgem acompanhada por dois anjos. A cada Ave-Maria recitada, uma bela rosa lhe saía da boca; os anjos tomavam a rosa e a colocavam sobre a cabeça da Rainha, a qual demonstrava satisfação.
Na demora desse segundo irmão que estava absorto na contemplação de tão grande mistério, ordenou o superior a outros dois irmãos que fossem ver o que se passava. Também estes foram agraciados com a sublime visão, e deram testemunho de que a Santíssima Virgem permaneceu ali até que a coroa tivesse sido completada.
Não é maravilhoso tomar conhecimento de fatos como esse? Consegues perceber em que realidade se fundam as representações pictóricas dos santos envoltos em uma luz que vem do céu e como o Espírito Santo vai conduzindo a história da Igreja por meio desses mesmos fatos que são levados ao conhecimento dos pobres e ignorantes?
Agora, meu irmão, não deixes de coroar essa Mãe Santíssima com esse presente que lhe é tão doce e agradável. Se não podes oferecer a ela uma grande coroa, que é o Santo Rosário, oferece ao menos um pequeno chapéu de rosas, que é o Santo Terço, e verás derramadas sobre tua própria cabeça as Graças que foram confiadas à administração dessa Rainha Prudentíssima.
Que Deus abençoe a todos e ao apostolado Cooperadores da Verdade.