Estás ciente, meu amigo, qual é o fim último da tua vida. Vives como quem corre uma maratona cujo prêmio é a coroa da glória eterna e que são muitas as pessoas que não conseguem concluir o trajeto, e que algumas há que até tentaram valentemente por algum período de tempo e que depois acabaram por desistir.
Sabes também que para isso foste criado, e que tua alma só encontrará repouso quando de todo o coração entregar-te. Sabes até que te é necessário aos poucos morrer para tudo aquilo que é peso e que torna essa corrida impossível ou extremamente difícil, por mais doloroso que às vezes te pareça abandonar essas quimeras que te parecem tão agradáveis.
Mas, se já tens alguma experiência, deves ter percebido que o caminho não é tão certo e as regras do jogo nem sempre são tão claras; se tens um pouco de humildade, já deves ter percebido a essa altura que parece até mesmo impossível concluir a corrida com um mínimo de razoabilidade. Ouviste também dizer, bom católico que és, que nessa corrida não deves vencer somente a ti mesmo, pois o trajeto é muito acidentado por circunstâncias que escapam ao controle do mais virtuoso dos corredores (quem dirá de ti!) e que há muitos inimigos, visíveis e invisíveis, que envidam esforços para que não consigas chegar a um bom termo em tudo isso.
Creio que me fiz entender. Sabes que és fraco, ignorante e por vezes malicioso, e que, não bastasse isso, és rodeado por um mundo de pessoas que não correm na mesma direção e pelo próprio diabo, que não descansará um momento sequer até o fim de tua jornada para que compartilhes de seu miserável destino de eterna inimizade com Deus. Falo da carne, do mundo e do diabo.
No encontro passado recomendei que passasses a considerar a realidade de que a Santa Mãe de Deus é, nessa laboriosa trajetória, tua mãe, esposa, patrocinadora, treinadora e muito mais. Falei-te propositalmente que a Virgem Maria, vista como treinadora, é aquela que tem em seu histórico o treinamento dos maiores atletas do mundo. Refiro-me a todos os santos que a ela recorreram, desde S. José a Carlo Acutis.
Quero dar-te um exemplo de como é grande o poder dessa Santíssima criatura.
S. Brígida, em uma das revelações que recebeu do Céu, relata que ouviu Jesus Cristo dizer à sua Santa Mãe: “Podes obter a divina graça até mesmo a Lúcifer caso ele se humilhe e implore teu auxílio”. Sabemos que é impossível que esse espírito tão soberbo se humilhe. No entanto, tão grande é o amor que Cristo tem por sua Mãe Santíssima que até mesmo ao mais terrível pecador (isto é, o próprio diabo) estaria pronto a conceder o perdão se Ela isso lhe pedisse.
Isso certamente se dá porque Jesus, sendo rei de todo o universo, deu à Santíssima Virgem Maria participação em seu reinado. A Igreja nos ensina que foi coroada a pobre virgem de Nazaré pela própria Santíssima Trindade, ao que a invoca pelo título Rainha do Céu e da Terra. Se tirarmos as conseqüências desse ensinamento, facilmente podemos concluir com tantos santos de que ao domínio de Maria foram sujeitos os anjos, os homens e todas as criaturas.
Mas nesse domínio existe uma diferença fundamental entre Nosso Senhor Jesus Cristo e a Santíssima Virgem Maria. Em sua infinita sabedoria, dispôs Deus as coisas de modo tal que o juízo reservado aos homens e aos anjos está nas mãos do Filho, Jesus Cristo, ao passo que a misericórdia está no coração da Santíssima Virgem para que ela possa nos alcançar, por seus rogos e preces, perdão junto a Jesus.
É evidente que de Deus procedem todas as coisas boas, sendo Ele mesmo a fonte de toda a misericórdia, mas quis Deus dispor das coisas dessa forma primeiramente por seu infinito amor essa criatura Imaculada. A Santíssima Virgem é de todas as criaturas não só a mais perfeita; tamanha é a grandeza dessa Senhora que se somássemos todos os méritos de todas as demais criaturas, resultariam em quase nada diante dos méritos que a Santíssima Virgem obteve. E posso dizer ainda mais, meu caro irmão: Maria já possuía toda essa grandeza desde o primeiro instante de sua vida, naquilo que chamamos a Imaculada Conceição!
Sim. O que aprendemos na boa teologia é que desde o primeiro momento de sua existência, Maria obteve mais méritos que todos os santos juntos, do início ao fim da história da humanidade, e que desde o ventre de Santa Ana passou a acumular mérito sobre mérito, oferecendo-se inteiramente ao seu Criador sem cessar por um instante sequer.
Como não poderia Deus amar essa Santíssima criatura mais do que todas as outras? Fazendo o bom uso de sua liberdade, colocando em marcha todos os dons que havia recebido de Deus, e considerando-se a mais vil entre todas as criaturas, a Santíssima Mãe alegrou o coração do Divino Criador de tal modo que convenceu o próprio Verbo Eterno a assumir a forma humana em seu seio virginal.
Está escrito que Deus viu tudo o que fez e que era muito bom, mas esse deleite do Criador é quase nada comparado ao deleite que teve em contemplar a alma da Santíssima Virgem Maria em sua Imaculada Conceição.
Mas também Deus pensou em nós, pecadores. Eu, particularmente, não sei dar as precisas razões teológicas do que vou explicar agora, mas sei que de fato as coisas são assim.
É da experiência comum das almas devotas de Nossa Senhora que alcancem maior eficácia em suas preces se as fazem por meio de Maria. As objeções são evidentes: Jesus Cristo é o salvador da humanidade, é o próprio Deus, fonte de todo o bem e digno de ser amado sobre todas as coisas. Nossa Senhora, em toda a sua glória, nada é comparada ao Divino Criador, pois todos os dons com que fora dotada procedem de Deus e tem ao próprio Deus como fim último.
No entanto, é assim mesmo: Se pedimos uma graça a Jesus por meio de Maria, mais eficazmente a alcançamos; se pedimos o perdão a Jesus por meio de Maria, de modo muito mais sublime nos convertemos e crescemos na vida da virtude; se amamos a Jesus por meio de Maria, muito mais intensamente a chama do divino amor arde em nossos corações.
Ademais, percebemos que o nosso coração tem muito mais confiança ao pedir misericórdia para Nossa Senhora, e isso se dá porque a figura materna sempre inspira clemência (e por vezes até condescendência!), enquanto que a figura paterna inspira o temor e o peso da autoridade.
Deves conhecer ou ter ouvido falar, assim como eu, de alguma pobre alma desgraçada que caiu no vício das drogas e passou a viver em condição lastimável. Esses pobres miseráveis muitas vezes tornam a vida da família um verdadeiro inferno, roubando as coisas de casa para comprar drogas, fazendo escândalos na vizinhança quando não lhe dão dinheiro e muitas outras insanidades.
Nessas histórias, quase sempre se sucede uma diferença contrastante entre os pais. A mãe, que parece sempre ser a mais afligida pelos sofrimentos e desatinos do filho, é aquela que sempre estende a mão, dando-lhe comida ao portão e até mesmo colocando-o dentro de casa na ausência do pai. Este, por sua vez, parece sempre duro diante da situação, sendo irredutível e capaz até mesmo de entregar o filho à polícia para que tomem as devidas providências.
Não quero aqui entrar em um exame moral em relação a essas duas posturas contrastantes. Se formos razoáveis, veremos que tanto o pai como a mãe não estão totalmente certos, mas que também não estão totalmente errados. A mãe parece por vezes errar pela falta de prudência, ao passo que o pai erra pela falta de caridade.
Mas fato é que a mulher foi dotada dessa ternura para com os filhos, e não me refiro a um dom sobrenatural próprio das santas mulheres. Refiro-me ao fato de que próprio Deus dispôs na natureza da mulher esse tipo singular de doçura, de modo que isso se observa como uma constante ao longo de toda a história da humanidade, independentemente de outros fatores como a própria religião.
Esse é um daqueles conhecimentos que as pessoas têm como que impregnados em sua inteligência, sem que para isso tenham feito qualquer raciocínio mais elaborado. Simplesmente sabem que as coisas são assim.
Creio ser esse o motivo de ter nos dado o Eterno Pai uma Santa Mãe. Não é porque falta a Deus a misericórdia de que necessitamos, ou porque a sua justiça esteja em conflito com o seu amor, mas por causa da fraqueza humana e da incapacidade que tem a criatura de conhecer a Deus mais perfeitamente, pois o intelecto do homem foi obscurecido pelo pecado.
Há também outro motivo pelo qual o Eterno Pai nos deu uma Mãe. Maria é criatura humana tal como nós. Deus, cuja essência nos é quase que inalcançável, sabe que a criatura humana necessita desse laço de identificação. Embora sejamos criaturas feitas à imagem e semelhança de Deus, temos uma natureza distinta: somos uma alma humana unida a um corpo humano, enquanto Deus é espírito. Aí também está a diferença entre nós e Jesus Cristo, Verbo Eterno de Deus que se fez carne. Este, embora tendo criado para si uma alma humana unida a um corpo humano, não deixa de ser Deus, de tal modo que essas duas naturezas distintas coexistem perfeitamente no mesmo ser, sem que a divindade anule nada da humanidade e vice-versa. Com efeito, a realidade da encarnação se nos afigura como um grande mistério, de tal modo que nos é difícil identificarmo-nos com toda a perfeição nesse quadro.
Confesso que não era a minha intenção fazer um breve tratado sobre temas tão profundos e que francamente fogem à minha capacidade. Não sou teólogo e não estudo para sê-lo. Mas deves perdoar-me se com toda a parcialidade desse mundo me coloco a meter-me em assunto tão espinhoso para justificar a devoção que deves ter para com a Santíssima Virgem Maria.
Aproveitando que hoje estás disposto a me tratar com paciência, quero revelar-te mais um pensamento que me ocorreu enquanto escrevia essas linhas, para que entendas em quão grande conta deves ter essa Santíssima Mãe.
Maria não é somente uma criatura disposta por Deus para auxiliar a humanidade em suas necessidades, como que um adereço da graça de Deus. Maria é de fato protagonista na história da redenção da humanidade. As Sagradas Escrituras deixam isso claro no mistério da anunciação. O Anjo do Senhor, ao dirigir-se a Maria, espera da pobre virgem de Nazaré um consentimento para que o Espírito desça sobre ela. Esse consentimento, esse ato de vontade e de correspondência que dependia unicamente de Maria foi por ela dado, de modo que podemos dizer com toda a razão que o Verbo se encarnou por um ato de vontade de Deus e de Maria! Não houvesse o sim de nossa Senhora, não teria o Divino Verbo se encarnado em seu seio, e não teríamos nós obtido a redenção pelo mistério da morte e ressurreição de Jesus Cristo.
Desse modo, podemos concluir que Maria não só é um auxílio para a nossa salvação, mas uma verdadeira necessidade, de tal modo que todos aqueles que são salvos só o são por meio de Maria. Assim a chamamos de Corredentora da humanidade decaída.
É essencial, pois, que comecemos essa preparação por um profundo entendimento do quanto devemos a Maria a única chance que nos foi dada de escapar do destino merecido por todos os homens. Deus quis que por meio de Maria fôssemos salvos por Jesus, e se dispôs as coisas dessa forma, é porque sabe que isso lhe rende a maior glória possível cooperando maximamente com o bem de todas as criaturas.
Portanto, meu irmão, deves imediatamente começar a pensar nos modos pelos quais deves extrair dessa realidade o máximo proveito possível, e isso se faz conhecendo e praticando os atos de devoção a Nossa Senhora que são ensinados pela Santa Igreja e cujos frutos maravilhosos podemos conhecer pela vida dos santos. Alguns deles, como o Santo Rosário, foram ensinados pela própria Virgem Maria e abraçados pela Santa Igreja como um divino auxílio.
Quero indicar-te em nosso próximo encontro uma devoção singular que é muito agradável à Santíssima Mãe de Deus e que em pouco deve trazer grandes frutos espirituais para a sua vida. Continuaremos ainda a mostrar por meio dos relatos mais diversos as graças que muitas pessoas obtiveram por serem devotas da Santíssima Mãe de Deus.
Que Deus abençoe a todos e ao apostolado Cooperadores da Verdade!