Os livros são “o eterno alimento da alma”, como diz venerável documento medieval (a Regra dos Cartuxos). As idéias que eles veiculam não podem deixar de ter influência na formação dos leitores. Se a Palavra de Deus é Vida (cf. Jo 6,64), a Palavra do erro é certamente veneno (gangrena, diz São Paulo em 2Tim 2,17) portador de morte. “As más companhias corrompem os bons costumes”, como já verificava o poeta grego Menandro citado por São Paulo (cf. 1 Cor 15,33); ora o livro sempre foi considerado um dos companheiros mais íntimos do homem… “Não há talvez poder de sugestão comparável ao da leitura, pois não há outro que tanto se aproxime da autossugestão” (J. Forget, Index, em “Dictionnaire Apologétique de la Foi Catholique” II. Paris 1911, 706).
Sendo assim, entende-se não ser desejável que qualquer pessoa leia qualquer livro, mesmo que o faça com intenção de defender a verdadeira religião; se o leitor não possui sólida formação (coisa que não se pode sem mais supor na multidão dos homens), deixa-se facilmente enredar pelo erro. É esta a razão por que a Santa Igreja, consciente da sua missão de santificar o mundo, vigia sobre os livros que seus filhos escrevem e leem, impondo-lhes oportunas restrições. Não há pai nem mãe que não detenham seus filhos de brincar com o fogo ou manusear uma arma perigosa. — De resto, e isto é muito importante, a própria lei natural, anteriormente a qualquer declaração positiva, nos diz que pessoa nenhuma tem o direito de continuar a ler um livro que ela perceba estar-lhe causando efeitos nocivos; esta proibição do Direito natural foi particularmente inculcada pelo Santo Oficio em 1943; a Santa Sé deseja que os Srs. Bispos a recordem aos fiéis (cf. “Acta Apostolicae Sedis” XXXV 144 s). Não há dúvida, maior é o número de livros proibidos pela lei natural do que o de obras vedadas pelo índice da Igreja.
O desejo de preservar do erro (real ou presumido) parece ditado pela mesma lei natural a toda sociedade que estima seus valores. Foi, sim, posto em prática desde remota antiguidade pelas autoridades religiosas não cristãs: já antes de Cristo, por exemplo, os rabinos proibiam aos jovens de Israel, de menos de vinte anos de idade, a leitura do Cântico dos Cânticos. assim como a de vários capítulos do Gênesis e de Ezequiel, por julgarem que tais textos poderiam excitar perigosamente a imaginação dos adolescentes. Conforme refere o historiador cristão Eusébio de Cesaréia (+339), o rei Ezequias de Judá (716-687) mandou atirar ao fogo livros que, falsamente atribuídos a Salomão, eram aptos a levar à idolatria. Entre os pagãos, semelhantes cautelas estavam em vigor; referem Cícero (De natura deorum 1,23) e Latâncio (+ após 317 d. C., De ira Dei 9) que o demagogo Protágoras de Abdera (+411 a. C.) foi banido do território de Atenas por haver publicado um escrito com os seguintes dizeres: “A existência dos deuses… eis algo que eu não saberia nem afirmar nem negar”. A obra foi queimada em plena praça pública. Tito Lívio (L. XXV 1) cita um decreto do pretor romano M. Attilius, que mandava destruir os livros de profecias dos cartagineses. — No séc. 16, os próprios “reformadores” protestantes não hesitaram em seguir tal praxe: Lutero lançou ao fogo o ‘Corpus Júris Canonici’; seus discípulos proscreveram as obras dos “reformados” zwingliancs e calvinistas, provocando igual reação por parte destes.
Na Igreja Católica a condenação de livros, ao menos sob forma esporádica, é praticada desde os primeiros tempos. Conhece-se o chamado “Fragmento de Muratori”, documento redigido por volta do ano de 196, em que, ao lado de livros bíblicos e outros edificantes, são mencionadas obras hereges, “as quais não podem ser aceitas na Igreja”. No séc. 5.° o “Decreto Gelasiano” apresentava semelhante catálogo. Foi, porém, a partir do séc. 15, após a descoberta da imprensa, que se multiplicaram os livros nocivos, exigindo vigilância mais assídua por parte das autoridades: o Imperador Carlos V, recorrendo à colaboração dos teólogos da Universidade de Lovânia, mandou em 1529 redigir um catálogo de livros a ser proibidos nos Países Baixos. O Papa Paulo IV por sua vez publicou em 1557 e 1559 um índice de livros vedados. Para assegurar a tarefa de censura, o santo Pontífice Pio V em 1571 fundou em Roma a dita “Congregação do índice”, a qual exerceu suas atribuições até que em 1917 o novo Código de Direito Canônico as transferisse para a Congregação do Santo Ofício (à qual toca a censura das doutrinas e dos costumes em geral).
Hoje em dia, além dos livros explicitamente proibidos pelo índice, outros há que são proscritos por cláusulas gerais do Direito Canônico. independentemente de qualquer declaração especial da autoridade eclesiástica (cf. cân. 1399). Tais são, em resumo:
a) as obras que diretamente ataquem a religião, a fé cristã ou os bons costumes;
b) os escritos que tratem explicitamente de assuntos lascivos e obscenos, seja sob a forma de narrativa, seja sob a de tratado sistemático (está claro que nem todo romance de amor cai sob esta categoria);
c) os livros e brochuras que narram aparições, revelações, visões, profecias, milagres ou preconizam novas devoções sem ter sido previamente submetidos à aprovação eclesiástica (cf. cân. 1385 § 1);
d) os livros que ensinam ou recomendam a superstição, a adivinhação, a magia, a evocação dos espíritos e práticas análogas;
e) as edições da Sagrada Escritura que não apresentem notas explicativas nem aprovação eclesiástica.
Como se compreende, a intenção da Igreja, ao impor restrições à leitura, não é em absoluto a de dominar pelo obscurantismo nem retardar o progresso da ciência. Por isto os fiéis, principalmente os que estudam, lecionam e escrevem, podem obter licença para ler obras proibidas, desde que apresentem válidos motivos. Em vista disso, é necessário se dirijam ao Bispo diocesano de que dependem, o qual dará autorização em casos urgentes (cf. cân. 1402), ou encaminhará ao Santo Ofício o pedido, acompanhado da respectiva justificação e recomendação. Frequentemente os Núncios e Delegados Apostólicos possuem as faculdades para conceder a devida permissão. A fim de simplificar o trâmite, recomenda-se aos fiéis interessados consultem seu Pároco ou seu confessor, que lhes dará a orientação precisa a seguir.
O poder de influência da leitura
A inteligência humana, feita para apreender a verdade mediante o raciocínio, nutre-se de idéias: adquirindo idéia após idéia, vai ela acumulando um cabedal doutrinário de importância máxima, decisiva do destino temporal e eterno que tocará ao respectivo sujeito.
Ora é inegável que as idéias se transmitem mediante a palavra. A palavra, por sua vez, é ou escrita ou oral, apresentando num e noutro caso seu poder de ação próprio, mas sempre muito penetrante.
A palavra oral é dotada de vivacidade própria; o tom da voz, a expressão do semblante, os gestos, de quem fala, concorrem para dar à palavra uma força de sugestão característica. Sabemos que o magistério na antiguidade se exercia quase exclusivamente pela palavra oral; a letra parecia aos antigos um veiculo mudo e frio, capaz de depauperar a vida de uma alma que se quisesse comunicar. — Estas observações, inegàvelmente válidas até hoje, levam-nos a afirmar que nunca se poderá extinguir o magistério oral na formação das gerações humanas.
Mas. sem desdizer à estima para com a palavra oral, notemos agora a forca de penetração que compete à palavra escrita ou ao livro.
O livro é, sim, um mestre ou amigo silencioso a quem espontaneamente tendemos a nos abandonar com toda a confiança, deixando que ele nos vá insinuando não somente as idéias que estamos acostumados a professar, mas até mesmo as que, à primeira vista, seríamos propensos a repudiar.
Com efeito, todo indivíduo está psicologicamente predisposto a atribuir autoridade a um autor de livro; … autoridade, isto é, capacidade para ensinar ou dirigir. Não é vã a assonância que une os termos «autor» (= escritor) e «autoridade» (= poder maior para orientar); o fato de que alguém se torne autor de livro parece conferir a esse escritor soberania e prestígio para insinuar atitudes e incutir doutrinas. É tão espontânea à natureza a tendência a argumentar a partir do que dizem os autores !
Quando um pensador apresenta de viva voz a sua doutrina, mais fàcilmente o público exerce sobre ele o devido controle; quando o mestre se ergue diante de um auditório, os ouvintes tendem também a se erguer em sua personalidade; principalmente se o orador propõe algo de contrário às idéias do auditório, o garbo e o amor próprio incitam naturalmente os ouvintes a reagir. O mesmo, porém, não se dá quando a ideologia antagônica é proposta por escrito; então, sem o saber nem querer, o leitor abre-se com mais facilidade; pode tomar a atitude de discípulo muito dócil sem que alguém (nem o próprio leitor) observe que se vai rendendo; o sugestionismo exercido pelo escritor se assemelha muito a uma autosugestão do próprio leitor e, por isto, facilmente passa despercebido a este.
Ademais, observe-se que a influência da palavra falada é geralmente rápida; impressiona no momento, mas pode ser sem delongas superada pela influência de outro agente que sobrevenha; ao contrário, a ação da palavra escrita, embora seja menos impressionante e sensível, é mais duradoura e profunda; o livro fica sempre à disposição do leitor, que a ele volta movido por uma simpatia talvez pouco consciente, mas real e, por vezes, corrosiva.
Estas considerações nos levam a reconhecer o extraordinário alcance que pode ter a palavra escrita na formação de uma personalidade humana.
Dentre as diversas categorias de livros, os que por si tendem a exercer mais profunda influência, são certamente os livros de doutrina.
As idéias constituem sempre as forcas motrizes da atividade, de modo que desatinar uma inteligência é concorrer poderosamente para o desmoronamento de uma ética. Ao contrário, quando apenas os costumes se corrompem, permanecendo incólumes as idéias na mente do homem viciado, a situação é menos grave; desde que tal indivíduo reconheça que procedeu mal, um ato generoso de vontade auxiliada pela graça de Deus, pode reerguê-lo ao plano de vida anterior. Sendo assim, compreende-se que os livros disseminadores de falsa filosofia ou de errôneas concepções da vida sejam extremamente nocivos; obras como as de Rousseau, Augusto Comte, Karl Marx marcam etapas na história…
Note-se, porém, que essas grandes sínteses doutrinárias não costumam ser de fácil acesso ao público; parecem enfadonhas ou obscuras à grande massa; por isto na vida cotidiana não constituem o tipo de leitura que mais prejudica o público. Há outra modalidade de livros que, na realidade, maiores males produzem; são os chamados «romances ideológicos» ou «romances de tese», aos quais vamos aqui dedicar breve reflexão.
O romance ideológico se caracteriza por apresentar uma doutrina, não, porém, de forma abstrata, mas bem concretizada num caso insinuante, que, sensível ou insensivelmente, tende a se impor como modelo ao leitor. A Psicologia ensina que toda idéia humana é sempre acompanhada de uma imagem mental; não há idéia dissociada da respectiva figura concreta que a excita e sustenta diante da inteligência humana (basta lembrar, por exemplo, a origem do alfabeto: os sinais que hoje indicam sons universais — A, B, C… — a principio indicavam os objetos concretos que, na mente dos homens, excitavam a reminiscência de tais sons). Pois bem; o romance ideológico atende de maneira particular a esse processo do conhecimento humano : descreve episódios e reproduz diálogos empolgantes, que entram pela alma do leitor, apoderando-se de todas as suas faculdades, despertando profundas ressonâncias; essas cenas excitam naturalmente no leitor o senso de imitação, o desejo sensacionalista (ora mais, ora menos consciente) de reviver a aventura do herói da peça. É por isto que a literatura de ficção inspirada por um fundo doutrinário se torna, junto ao grande público, muito mais influente do que os volumes de filosofia especulativa; estes, para ser assimilados, exigem mais esforço do que os romances de tese; tem-se dito mesmo que o poder sugestivo do romance é comparável ao de um hipnotizador; o mau romance pode ser assemelhado também a uma toxina ou a um câncer que vai minando a estrutura intelectual e moral do leitor.
“Estou acima das influências…“
Ao percorrerem estas linhas, talvez digam o homem culto, na base de sua formação científica, e o jovem movido por seu entusiasmo: «Sei perfeitamente subtrair-me às influências do livro. O mal que me possa ser sugerido, não me afeta». Ora, sem receio de errar nem de ser mesquinho, o homem realmente sábio lhes poderá replicar:
«Engana-se quem assim pensa. Às leis da natureza não nos conseguimos subtrair com facilidade. Pode acontecer que no momento da leitura evoquemos conscientemente idéias contrárias às do livro mórbido que vamos lendo; recalcaremos assim a força sugestiva do mal, mas nem por isto a teremos debelado por completo. Como já dizia Voltaire, alguma coisa da mentira ou do erro sempre fica… O que lemos passa a fazer parte do nosso psiquismo, desce à subconsciência e mais tarde dai subirá como estímulo ao mal, como tentação perigosa; é um soldado inimigo que se introduziu na praça forte…» (paráfrase do texto de L. Franca, A formação da personalidade 376).
Não há dúvida, todo homem tende naturalmente a confiar no seu espírito crítico, que o leva a discernir do bem o mal e a aceitar aquele com exclusão deste. Em geral, porém, ensinam os doutos experimentados que tal confiança decepciona amargamente, pois, na verdade, é muito raro neste mundo um espírito capaz de analisar objetivamente uma doutrina, distinguindo nela do provável o certo. O espírito autenticamente crítico supõe amplo conjunto de qualidades naturais: perspicácia, dom de análise, inteligência penetrante, bom traquejo da lógica, hábito de demonstrações rigorosas, além de filosofia sólida e cultura geral segura. Ora não pode deixar de ser muito exíguo o número daqueles que de fato dispõem de tal cabedal; dentre mil pessoas que o julgam ter, talvez uma só realmente o possua. Entende-se, porém, que a vaidade leve todo indivíduo a se identificar com esse único tal e a crer que são os demais homens que, por motivo de sua fraqueza, necessitam de se precaver de antemão contra os assaltos do mal.
Além disto, faz-se mister frisar que ao cristão jamais será lícito presumir algo de suas próprias forças; a natureza humana, deficiente como é, jamais pode pretender haver atingido a impecabilidade. Toda a ascese cristã visa, antes, avivar no discípulo de Cristo a consciência daquela palavra incisiva de Jesus: «Sem Mim nada podeis fazer» (Jo 15,5). A criatura humana, por mais sábia ou santa que seja, só não peca, porque o Salvador gratuita e benevolamente a preserva disto; ora, já que ninguém pode assegurar a si mesmo que de fato o Redentor lhe concederá tal graça, torna-se ilícito ao homem (mesmo ao que presuma ser douto ou virtuoso) expor-se voluntáriamente aos assaltos do mal; expor-se sem motivo ao mal seria tentar a Deus, isto é, presumir da parte do Senhor um auxílio gratuito para satisfazer ao capricho humano (tal presunção é pecaminosa). Em outros termos ainda: expor-se sem motivo ao mal viria a ser o mesmo que aceitar o risco de cometer o mal; e aceitar o risco do mal já seria, de certo modo, aceitar o próprio mal.
Os ditames da Igreja
São os princípios até aqui explanados que inspiram a posição da Igreja em relação à leitura de livros. Ela sustenta, sem dúvida, que não é licito a qualquer homem ler qualquer livro; a Santa Igreja, porém, frisa bem que tal restrição, antes de ser imposta por alguma lei eclesiástica, já é ditada pela própria lei natural. Sim, se a palavra é o alimento da alma, a palavra do erro ou da maldade é alimento venenoso para a alma; ora, assim como no plano corpóreo a lei natural, anteriormente a qualquer norma do médico, veda ao indivíduo tomar veneno conscientemente, assim também no plano espiritual a lei natural proíbe a comunhão com a palavra venenosa ou com a má leitura. E ninguém, ao ingerir veneno, alegue ter saúde bastante forte para se imunizar contra todo e qualquer efeito do tóxico… A alegação seria tida como temerária e inconsistente.
Por conseguinte, na matéria de que vimos tratando, a função da Santa Igreja consiste em lembrar a injunção da natureza e em explicitá-la, a fim de garantir os frutos da mesma. A Igreja é Mãe a quem o Senhor confiou a palavra da Vida ou o depósito da Verdade para ser transmitido aos homens. Consciente disto, a Esposa de Cristo julgou, e julga sabiamente, ser sua missão ir indicando e vedando aos seus filhos no decorrer dos séculos os livros nocivos à vida da alma; não há pai nem mãe que não detenham seus filhos de brincar com o fogo ou de manusear uma arma perigosa. Como se compreende, as leis da Igreja, neste setor, têm que ser universais, abrangendo os fiéis de toda e qualquer camada social; vão seria legislar apenas para os fiéis que «não tenham maturidade de pensamento ou formação sólida», pois a fraqueza humana é inerente aos próprios santos e doutos até o fim desta vida.
Os livros explicitamente proibidos pelo Direito Eclesiástico se acham mencionados em um catálogo próprio dito «índice». Além desses, há livros proscritos por cláusulas gerais do Código de Direito Canônico, independentemente de qualquer declaração da autoridade eclesiástica (cf. cân. 1399) ; tais outros livros já foram especificados em «P.R.» 6/1957, qu. 10.
Quanto ao critério seguro para se afirmar que um livro é proibido pela própria lei natural, os moralistas ensinam o seguinte: desde que alguém verifique que um livro, pelas idéias que propaga, pelos sentimentos que sugere ou pela impressão geral que deixa na alma, constitui incitação ao pecado e ameaça ao equilíbrio interior, a consciência já o proíbe; há então obrigação de suspender a respectiva leitura. Está claro que todo livro obsceno ou lascivo por sua natureza é de antemão vedado a qualquer leitor.
Sem dúvida, a Santa Igreja, ao explicitar o direito natural referente à leitura de livros, não quer de modo algum entravar o progresso da ciência. Por isto os fiéis que realmente necessitam de ler obras errôneas para poderem propugnar a verdade ou o bem com maior conhecimento de causa, estão habilitados a fazer nesse sentido um requerimento à autoridade eclesiástica, a qual lhes concederá tudo que for oportuno (para encaminhar devidamente tal petição, é conveniente que se dirijam ao respectivo pároco ou confessor).
Uma reflexão serena sobre o assunto ainda contribuirá para evidenciar quão sábia é a insistência da Santa Igreja em legislar sobre as leituras de seus filhos…
Os filósofos nos lembram que a vida presente é breve e que só no fim da vida a maioria dos homens descobre coisas que lhes teriam sido úteis já em sua juventude, coisas entre as quais certamente se deve enumerar o método de estudo e trabalho… Sendo assim, vê-se que, para evitar desperdiço de tempo e energia, convém a todo indivíduo recorrer a um magistério ou a uma autoridade que o preserve de dar passos inúteis e tentar caminhos vãos na pesquisa da verdade e do bem.
Ora tal magistério é, por excelência, o da Santa Igreja, a quem Cristo confiou o depósito da Verdade e da Vida. Requer-se, portanto, de todo cristão, seja humilde e aceite a sua condição de discípulo; fazendo isto, aproveitará melhor os breves dias desta peregrinação terrestre e mais certeiramente atingirá o seu ideal. São estas as idéias que nos sugere uma bela passagem de Jean Guitton no seu livro «Apprendre à vivre et à penser» (pág. 11):
Entre os aforismos de Nietzsche, seria preciso gravar com caracteres de fogo… o seguinte: ‘As verdades mais preciosas são aquelas que por último descobrimos; as verdades mais preciosas, porém, são os métodos’. Muitas vezes interroguei os homens e as mulheres que eu via serem metódicos, isto é, que me pareciam obter belos resultados com esforços limitados. Na maioria dos casos, eram pessoas que haviam sido, em certa fase de sua vida, detidas pela doença ou por uma sensação persistente de esgotamento e de cansaço, ou ainda que estavam sobrecarregadas de tarefas e haviam sido obrigadas a avaliar o preço do tempo. Chama a atenção o fato de que aqueles que nunca foram doentes e gozam de saúde quase excessiva, não são metódicos e perdem seu tempo, bem insubstituível. Lembro-me de Darwin, que escreveu e descobriu tanta coisa e que só podia trabalhar duas horas na parte da manhã; depois de haver ditado durante dez minutos, dizia ele a seu filho : ‘Basta’. É bom, seja breve o tempo que nos é deixado para produzirmos; é bom, seja ele tão precioso quanto essa existência sublime e tão precária que só nos é dada uma vez.
Consciente destas verdades, o cristão compreenderá melhor que não interessa ler toda e qualquer obra que lhe caia em mãos (para satisfazer à curiosidade ou para afirmar uma liberdade vã), mas interessa ler com método… com o método comprovado pela experiência dos séculos no seio da Santa Igreja !