O sacramento do matrimônio, conforme nos ensina nossa fé católica, foi instituído por Nosso Senhor Jesus Cristo no momento em que, questionado pelos fariseus se era lícito o homem abandonar sua mulher, o Verbo encarnado respondeu que aquilo não era vontade de Deus, mas fruto somente da dureza do coração. Assim, o que Deus une, não há o homem como o homem separar (Mt 19, 6).
A partir dessas premissas, o Direito Matrimonial Canônico foi se desenvolvendo, com a finalidade de se manter fiel ao que disse Jesus sobre a união entre o homem e a mulher. O Código utilizado atualmente é o de 1983, promulgado pelo Papa João Paulo II, que por sua vez contem uma parte especial que explica as finalidades do casamento católico, bem as causas que geram uma sentença de nulidade. Mas não são a essas últimas que vamos nos ater.
O assunto deste artigo é pouco conhecido, mas é devidamente regulamentado pelo nosso Código Canônico. Afinal de contas, pode um noivo católico se casar com uma noiva não-católica (e vice-versa) na Igreja Católica? A resposta é sim, mas dentro de certas condições que deverão necessariamente ser atendidas.
Para esses casos, a Igreja dispõe de duas possibilidades: o casamento misto e o casamento por disparidade de culto.
O casamento misto se trata da união entre cônjuges em que um é católico batizado, e o outro professa uma fé cristã que não está em plena comunhão com a Igreja Católica Apostólica Romana, conforme expressa o cânon 1.124:
Cân. 1124: “O matrimônio entre duas pessoas batizadas, das quais uma tenha sido batizada na Igreja católica ou nela recebida depois do batismo, e que não tenha dela saído por ato formal, e outra pertencente a uma Igreja ou comunidade eclesial que não esteja em plena comunhão com a Igreja católica, é proibido sem a licença expressa da autoridade competente”.
Em suma, entende-se este sendo o caso do casamento de católico com protestante, ou católico com ortodoxo, por exemplo. Neste caso, ambos precisam ser batizados. Dessa maneira, será o ordinário local (o Bispo) que concederá a autorização para o ato, caso preenchidos os seguintes requisitos, de acordo com o cânon 1125:
1ª – a parte católica declare estar preparada para afastar os perigos de defecção da fé, e prometa sinceramente fazer todo o possível a fim de que toda a prole seja batizada e educada na Igreja católica;
2ª – informe-se tempestivamente, desses compromissos da parte católica à outra parte, de tal modo que conste estar esta verdadeiramente consciente do compromisso e da obrigação da parte católica;
3ª – ambas as partes sejam instruídas a respeito dos fins e propriedades essenciais do matrimônio, que nenhum dos contraentes pode excluir.
Conforme expresso acima, a Igreja, mesmo que dê autorização para a cerimônia, preocupa-se com a fé da parte católica e com a dos filhos que virão dessa união, devendo a parte católica se comprometer a educá-los na fé.
Já o casamento com disparidade de culto é um pouco mais delicado, pois é a união de um cônjuge católico com um não-batizado, podendo este professar uma fé diferente do cristianismo (católicos, ortodoxos e protestantes, por exemplo).
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Esse tipo de casamento exige mais atenção por parte da Igreja, visto que ocorrerá a união de uma pessoa que pertence ao Corpo Místico de Cristo e outra que não. Assim, como no casamento misto, os requisitos do cânon 1125 devem ser necessariamente preenchidos, assim como os do cânon seguinte (1126), que determina que “Compete à Conferência dos Bispos estabelecer o modo segundo o qual devem ser feitas essas declarações e compromissos, que são sempre exigidos, como também determinar como deve constar no foro externo e como a parte não-católica deve ser informada”.
Assim expressa o cânon 1086, §1º sobre o casamento por disparidade de culto:
Cân. 1086 § 1. É inválido o matrimônio entre duas pessoas, uma das quais tenha sido batizada na Igreja católica ou nela recebida e que não a tenha abandonado por um ato formal, e outra que não é batizada.
§ 2. Não se dispense desse impedimento, a não ser cumpridas as condições mencionadas nos cânn. 1125 e 1126.
§ 3. Se, no tempo em que se contraiu matrimônio, uma parte era tida comumente como batizada ou seu batismo era duvidoso, deve-se presumir a validade do matrimônio, de acordo com o cân. 1060, até que se prove com certeza que uma das partes era batizada e a outra não.
Em suma, respondendo mais uma vez à pergunta inicial, sim, é possível contrair matrimônio na Igreja Católica com um não-católico, podendo ser essa união um casamento misto ou um casamento por disparidade de culto. Em ambos, existe a necessidade dos requisitos do cânon 1125, bem como a autorização do Bispo local.
Todavia, faz-se necessário um grande discernimento para a parte católica. Vale a pena colocar em risco a sua fé, bem como a fé dos filhos que virão, ao se unir com alguém cuja escolha é totalmente diferente da sua no âmbito religioso? A Igreja, como Mãe, exorta os seus fiéis a pensarem bem nessas questões, antes de se decidirem pela exceção, e não pela regra.