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O criminoso arrependido tem obrigação de se denunciar?

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Alguém cometeu grave crime, e se oculta. As circunstâncias parecem fazer recair a culpa sobre um inocente, que é detido pela polícia e está para ser condenado em lugar do réu. O criminoso terá então a obrigação de se denunciar? E, caso seja apreendido, o réu terá o dever de confessar a sua falta?

Os assuntos aqui abordados são assaz delicados, prestando-se facilmente a mal-entendidos. Procure, pois, o estudioso acautelar-se de maneira especial contra qualquer equivoco na interpretação das sentenças abaixo propostas.

Exporemos em primeiro lugar uma distinção que servirá de base à resposta.

1. Dever de justiça e dever de caridade

1.1. A justiça é a virtude que nos «ajusta» ou adapta a Deus e ao próximo, fazendo que demos a cada um aquilo a que tem direito; o objeto sobre o qual versa a justiça, costuma ser claro e definido, pois é geralmente estipulado pela lei. Sendo assim, a justiça pode por vezes obrigar alguém a reparar o dano causado ao próximo, desde que este tenha sido lesado em um de seus genuínos direitos. Assim, em caso de furto, a justiça pode exigir que o ladrão devolva a quantia roubada; em caso de calúnia, pode requerer que o caluniador restabeleça a boa fama do próximo…

Contudo, para que alguém seja, por justiça, obrigado a reparar o dano incutido ao próximo, requer-se que a ação do delinquente seja realmente causa, e não apenas ocasião, do prejuízo alheio; em outros termos :… requer-se que a ação do delinquente acarrete por si mesma o dano do próximo, de sorte que tal dano decorra diretamente de tal ação.

Exemplifiquemos: desferi um golpe que feriu levemente o meu adversário. A imperícia do médico, porém, fez que este ferimento, em si destituído de gravidade, degenerasse em gangrena, da qual se seguiu a morte da vitima… Em tal caso, não se pode dizer que o golpe por mim desferido tenha sido a causa dessa morte e que eu seja o culpado de tal dano, pois na verdade não houve nexo direto nem proporção entre a minha ação (pancada leve) e o prejuízo posteriormente verificado (morte da pessoa espancada); a imperícia do médico que interveio é que se tornou diretamente responsável pela perda da vítima, ao passo que a minha ação deve ser tida como mera ocasião (circunstância remota), e não como causa (agente produtor por si mesmo) do desenlace.

Os deveres decorrentes da justiça podem ser graves; tanto mais graves quanto mais importantes forem os direitos do próximo lesados. Verdade é que há por vezes motivos atenuantes, os quais dispensam, parcial ou totalmente, da reparação do dano causado: é o que se dá, por exemplo, com o ladrão que tenha gastado o dinheiro roubado e, por ser reconhecidamente indigente, não possui os meios de devolver a quantia furtada; este réu deverá arrepender-se sinceramente do mal cometido, mas, em virtude de suas condições pessoais, estará, de todo ou em parte, dispensado de restituir a importância retirada.

1.2. Além da justiça, também a caridade ou o amor ao próximo impõe obrigações para com este. À diferença, porém, do que se dá no caso da justiça, essas obrigações não correspondem a algum direito do próximo, não vêm objetivamente estipuladas pela lei. Isto quer dizer que são muito mais flutuantes, variando de acordo com as circunstâncias subjetivas de saúde, riqueza, posição social… das pessoas interessadas.

Disto não seria lícito deduzir que não há pròpriamente dever de caridade. Este não somente existe, mas é por vezes mesmo muito grave. Com outras palavras: quando se diz que alguém está obrigado a tal obra «por caridade apenas» e não «por justiça», não se quer significar que a obrigação é menos premente, mas apenas que o título da obrigação é diferente. A caridade é envolvida no exercício de qualquer outra virtude, mas pode haver exercício de caridade que não envolva o de alguma outra virtude (dai falar-se de «obrigação de caridade apenas»).

Apliquemos a distinção à solução dos casos propostos.

2. Obrigação de justiça?

Formularemos por etapas a nossa resposta.

2.1) O réu não tem obrigação (de justiça) de se denunciar ou de se apresentar por si mesmo aos juízes.

Os moralistas justificam esta proposição do seguinte modo: existem na sociedade civil autoridades e instâncias encarregadas de ir ao encalço dos delinquentes e de os deter; a sociedade está aparelhada para lutar contra os malfeitores e os reprimir. É, portanto, aos órgãos de defesa da sociedade (ou seja, geralmente à policia) que compete, em justiça, o dever de procurar e julgar o réu. Enquanto este não é apreendido e comprovado como réu, pode usufruir do direito à boa fama que toca a todo cidadão.

Com efeito; se não há indícios do contrário, deve-se presumir que todo individuo é honesto e digno; a desonestidade e a indignidade não podem ser pressupostas de antemão, mas hão de ser comprovadas; enquanto tais provas não vêm apresentadas ao público, todo individuo tem direito à boa reputação na sociedade.

Baseando-se nesse princípio, acrescentam os moralistas que, antes do processo judiciário, o réu tem o direito de ocultar o seu delito e de afastar de si os indícios que provoquem suspeita; tem mesmo o direito de fugir e de se ocultar para não ser encarcerado. Só não lhe é lícito usar de mentira ou fraude para dissimular o seu delito; muito menos lhe é permitido proceder de modo a fazer recair as suspeitas de crime sobre outra pessoa (cf. Pallazzini-Jorio, Casus conscientiae. Turim 1958, 671-75).

O Papa Inocêncio XI em 1679 condenou a seguinte proposição:

«É provável que não peque mortalmente quem atribui falso crime a outrem, a fim de defender a sua justiça e a sua honra. E, se isto não for provável, dificilmente haverá alguma opinião provável em teologia» (Denzinger, Enchiridion 1194).

Estas afirmações serão corroboradas e ulteriormente elucidadas pelas proposições que se seguem.

2.2) Durante o processo judiciário, o acusado tem o direito de se defender por meios lícitos e justos; não está obrigado a confessar o seu delito.

Tanto na legislação da Igreja como na das principais nações modernas, as normas de defesa reconhecem ao acusado o direito de querer passar por inocente, enquanto o contrário não for devidamente comprovado. Em outros termos: nenhuma legislação exige estritamente que o réu confesse o seu crime.

Eis os cânones eclesiásticos concernentes ao assunto:

Cân. 1743 § 1. «Ao juiz que as interrogue legitimamente, as partes interrogadas estão obrigadas a responder e dizer a verdade, a menos que se trate de delito cometido por elas mesmas.

$2. Se a parte interrogada se recusa a responder, toca ao juta avaliar o significado dessa recusa e decidir se é justa ou se equivale a uma confissão.

Cân. 1744. Nas causas criminais, o juiz não exigirá do acusado que juiz dizer a verdade; nas causas contenciosas, todas as vezes que o bem comum estiver em jogo, o juiz o exigirá das partes postas em causa; nos outros casos, ele o poderá exigir, de acordo com a sua prudência».

Como se vê, o cân. 1743 dispensa da obrigação de responder as pessoas acusadas de delito por elas mesmas cometido (é claro, porém, que mentir nunca lhes será lícito; fica-lhes apenas a liberdade de guardar o silêncio, em vez de responder).

Certos autores antigos (entre os quais, São Tomás de Aquino)] afirmavam estar o réu obrigado a confessar o delito, desde que fosse interrogado por legítimo juiz, principalmente se já houvesse indícios assaz claros da culpa («semiplena probatio»; cf. S. Tomás, S. Teol. H/n 69, 1). Hoje em dia os moralistas não costumam sustentar essa sentença, invocando o direito à boa fama que toca a cada individuo.

Quanto ao juramento de dizer a verdade, o cân. 1744 proíbe ao juiz que o imponha ao acusado de causas criminais. O motivo disto é o desejo de se evitar qualquer extorsão ou violência da personalidade humana.

O acusado que jurasse, poderia cair em grave conflito interno, pois seria premido, de um lado, pela palavra dada em juramento e, de outro lado, pela previsão das penosas consequências de sua confissão; o constrangimento assim causado é tido como algo de desumano e, por conseguinte, algo que se deva evitar. Percebe-se muito claramente hoje em dia que o papel do juiz consiste em solicitar a confissão e confundir o réu com as suas provas de delito, mas não em extorquir declarações por qualquer meio. Respeita-se assim melhor a liberdade humana, que é uma das mais nobres prerrogativas outorgadas pelo Criador ao homem.

A sociedade tem, sim, o direito de se defender contra os que transgridem as suas leis, mas não lhe compete devassar a consciência dos seus membros.

Tal tratamento, de resto, não impede que penas mais severas sejam impostas aos culpados que tenham recusado confessar um delito do qual venham a ser evidentemente reconhecidos como réus. — Observe-se outrossim que o direito de «não jurar» (ou silenciar) de modo nenhum significa direito de «mentir» (ou dizer o contrário da verdade).

2.3) Ainda que um inocente esteja para ser condenado, o réu não tem obrigação, em justiça, de se acusar.

Note-se antes do mais: trata-se aqui de obrigação de justiça, não de caridade.

A afirmação acima baseia-se no fato de que o réu não é, por si, causa da condenação do inocente; a causa verdadeira é a imperícia da polícia — imperícia que se exerce por ocasião do delito cometido pelo réu. Supõe-se naturalmente que este delito não estava necessariamente associado à condenação de tal inocente; em tal caso, não fora a inépcia das autoridades, o inocente nada sofreria, pois o criminoso como tal nada teria feito contra esse inocente.

Dado, porém, que o criminoso haja feito alguma coisa que levasse os juízes a suspeitar do inocente, o réu teria parte e culpa na condenação desse inocente; caber-lhe-ia então o grave dever de se denunciar para libertar o justo não culpado. É o que se dá, quando, por exemplo, o delinquente usa das vestes de outrem para cometer o crime ou lança em casa do vizinho o revólver ou a espada de que se serviu para matar…

É licito ao réu que não tenha contribuído para a condenação do próximo, recorrer ao seguinte expediente: desejando evitar o detrimento do justo inculpado, encarregue um sacerdote, ou outra pessoa de sua confiança, de pleitear do tribunal a revisão do processo; assim talvez se apure a inocência do pretenso réu. O desempenho dessa missão será sempre difícil e delicado para quem a aceitar.

Propõe-se por vezes o caso: certas pessoas (médicos, enfermeiros, serventes…), em segredo profissional, adquirem conhecimento da culpa do verdadeiro réu; têm o direito de violar tal segredo para libertar o inocente e entregar o criminoso ou ao menos pedir revisão do processo no tribunal? — Respondem os moralistas negativamente: a revelação de segredo profissional acarreta sempre grave detrimento não somente para o indivíduo que confiou o segredo, mas também para a sociedade. Sim; o bem comum exige que todos os cidadãos possam tranquilamente ir pedir conselho às pessoas Idôneas e autorizadas, sem temer divulgação do respectivo caso. Ora, se a situação assim manifestada não ficasse firmemente envolvida em silêncio, muita gente não ousaria mais consultar nem médico, nem advogado, nem educador… — o que seria prejudicial tanto para os indivíduos como para a sociedade; é preciso, portanto, que todos estejam seguros da inviolabilidade do segredo profissional. Mesmo que o beneficiário do segredo desligue o profissional da obrigação de silêncio, o profissional pode julgar não ser oportuno revelar o caso, pois a guarda do segredo pode ser de interesse não só de tal indivíduo, mas também da sociedade; ademais pode-se alegar que o indivíduo que desliga do segredo, não está consciente de todo o alcance do seu gesto.

Claro está que o segredo decorrente da confissão sacramental (feita a um sacerdote) em caso algum pode ser violado; não se admite exceção, nem mesmo esporádica, neste setor.

2.4) Mesmo que não tenha o dever de se acusar, o réu ainda fica obrigado a devolver os bens alheios que haja furtado ou lesado ao cometer o seu delito.

É clara esta sentença, pois o direito à boa fama ou o pressuposto de inocência ainda não dá direito a alguém de conservar consigo bens alheios injustamente adquiridos. Caso não os possa , restituir ao proprietário, o criminoso estará obrigado a desfazer-se deles de algum modo, procurando aplicá-los, se possível, em obras de piedade ou caridade…; ser-lhe-á lícito, para tanto, recorrer a um intermediário, ou seja, a pessoa honesta e discreta que se desincumba da sua missão sem denunciar o delinquente.

3. Obrigação de caridade?

Verificávamos no parágrafo 1 desta resposta que, mesmo onde não há obrigação de justiça, pode haver obrigação de caridade. É o que se pode dar quando um inocente é acusado em lugar do verdadeiro réu; embora este nada tenha feito que por si contribuísse para isso, pode tocar-lhe em certos casos o dever de evitar a condenação da pessoa inculpada mediante a denúncia de si mesmo.

A existência e a gravidade desse dever de caridade dependerão muito das circunstâncias subjetivas do réu, pois não estão estritamente baseadas num direito do próximo nem objetivamente formuladas pela lei. O delinquente pode ter obrigações (mesmo de justiça) para com outras pessoas, principalmente se é esposo e pai de família; o dano acarretado a essas pessoas poderia ser maior do que o- benefício feito ao inocente pela denúncia do criminoso.

A um observador (conselheiro, diretor espiritual…) torna-se mais difícil ponderar a obrigação do que no caso de um dever de estrita justiça: tenha-se por certo que a obrigação de caridade vem a ser tanto mais imperiosa quanto mais pesada é a pena à qual o inocente está para ser condenado. Quem decide, porém, qual a atitude a tomar, é o próprio delinquente em sua consciência perante Deus.

Na prática, siga o diretor espiritual ou conselheiro a seguinte norma: sendo informado de que um inocente foi detido pela polícia em lugar do criminoso, veja se há meio de evitar o erro judiciário, sem denúncia do delinquente; caso não o haja, exorte o criminoso a avaliar todas as suas responsabilidades e a se entregar à justiça, desde que veja ser este o seu dever; lembre-lhe que, com um só gesto seu, pode deter uma ação errônea e gravemente prejudicial para o próximo. Havendo, porém, obrigação não de justiça, mas de caridade, não compete ao diretor espiritual definir peremptoriamente, em lugar do réu, qual a conduta que este deva adotar.

As normas acima (comuns entre os bons moralistas é juristas) talvez causem surpresa a um ou outro leitor. Para se evitarem conclusões funestas, alheias à moral sadia, esses princípios hão de ser lidos com vagar e interpretados em sentido estrito, levando-se em conta o eventual rigor do dever de caridade.

Apêndice: O Sigilo Sacramental

Um documento recente sobre o segredo da confissão.

Para ilustrar o que acaba de ser dito, noticiamos aqui o seguinte caso, assaz significativo:

A.1. Francesco Arando foi condenado na França a trabalhos forçados perpétuos, a titulo de haver sido um dos assassinos do joalheiro M. van Malle.

Acontece, porém, que o capelão da Penitenciária de Baumettes em Marselha (França) foi informado de que Francesco Arando era inocente do crime. Esta notícia, o sacerdote a recebeu em segredo (segredo confiado, não, porém em confissão sacramental, como o próprio padre declarou). O capelão resolveu então escrever ao Ministro da Justiça da França uma carta em que, com as licenças e reservas formuladas pelo autor da notícia, atestava a inocência do pretenso réu. A família deste obteve do padre uma cópia de tal carta e sem demora a publicou na imprensa. Eis os principais trechos da missiva:

“As minhas funções levam-me por vezes a tomar conhecimento de tremendos segredos. Ultimamente isto se deu; tal é a razão de ser da minha carta… Tomo Deus como testemunha e empenho minha honra de ser humano para afirmar que o que estou para dizer à V. Excia. é a pura verdade… Sei, de fonte segura, absolutamente incontestável, que Francesco Arancio é de todo inocente. Arancio não é um dos três agressores do joalheiro. De modo nenhum teve ele parte, nesse caso. A pessoa que me revelou tudo isto e que bem sabe o que diz, só mo revelou sob o sigilo do mais absoluto segredo. Apesar da minha insistência, até agora só pude obter a licença de escrever a V. Excia. a presente carta, depois de a ter mostrado a essa pessoa. Nada mais posso dizer a V. Excia. Creia, porém, que minha palavra de sacerdote pode e deve ser levada em consideração, a fim de obter justiça para um inocente.

Queira V. Excia. aceitar minhas religiosas saudações.”

(a) Jean Idmozin (Transcrito de «La Crolx», de 20/21 de agosto de 1961)

Como se compreende; a carta do padre provocou numerosos comentários de jornais e revistas, os quais envolviam indevidamente questões de segredo da confissão e de comportamento dos capelães de prisões.

A.2 Para deter a onda de mal-entendidos assim desencadeada, Capelão-Chefe das Prisões da França, Mons. João Rodhain. publicou a seguinte nota:

«Desejoso de salvar um condenado que se afirmava inocente, o capelão de uma Penitenciária escreveu, no mês passado, ao Exmo. br. Ministro da Justiça. A família do condenado, tendo recentemente obtido do capelão uma cópia dessa carta, logo a publicou na imprensa.

Nessa famosa carta não se faz menção de confissão, mas tão somente de segredo confiado. Não obstante, vários jornais aproveitaram a oportunidade para tecer comentários sobre os capelães de Penitenciárias e o segredo da confissão. Nesses escritos nota-se mais boa vontade do que conhecimento de teologia e direito. Os principais pontos esquecidos são os seguintes:

1. Para qualquer sacerdote católico, seja ou não capelão de Penitenciária, a lei é a mesma; na administração do sacramento da confissão, a obrigação de sigilo é absoluta. O padre não pode, de forma alguma, fazer uso do que ele venha a saber na confissão. O Direito Canônico é formal. E não há escapatória possível.

2. Na confissão, muitas pessoas parecem ignorar que ao sacerdote compete um papel de médico. Não é mero ouvinte passivo. Indica os meios de curar o pecado. Propõe os remédios contra as tentações. Nos casos graves, deve impor as medidas a tomar, sob pena de ter que recusar a absolvição (caso não sejam aceitas pelo penitente).

Por conseguinte, se Pedro, testemunha de um desastre de automóvel, tem provas de que o motorista é inocente, mas hesita em declará-lo inocente, não me limitarei apenas a registrar a sua confissão; o confessor não é caixa registradora de pecados. Lembrarei, sim, a Pedro que ele está obrigado a dar tal testemunho perante a justiça. Mas não darei o testemunho em lugar dele. O confessor não é nem um advogado nem um para-brisa.

3.O pecado não constitui somente uma ofensa a Deus. Já que na Igreja estamos ligados com nossos irmãos pela caridade, ele constitui sempre uma ofensa à comunidade. Exige que seja prestado desagravo à comunidade. Em nove casos dentre dez, o público esquece este caráter «social» do pecado e da penitência…

4. Não vale aqui a analogia do confessor que se encarregue da restituição de um objeto roubado.

Com efeito. Se Paulo, tendo furtado um quadro precioso, se confessa disto, obrigo-o a restituir o quadro ao proprietário. A pedido dele, formulado fora da confissão, poderei encarregar-me de assegurar a restituição em seu lugar. Tal gesto alcançará o desejado efeito, o furto material será reparado e o segredo guardado.

Mas, se Paulo tem um testemunho a dar, não o posso dar em lugar dele. De fato, um quadro restituído é palpável, avaliável, controlável: qualquer tribunal poderá submetê-lo a peritos e reconhecer assim que o roubo foi realmente reparado.

Ao contrário, nenhum tribunal pode aceitar o depoimento não controlável de uma testemunha que se abriga atrás de pretensa lei de sigilo para não provar o que ela afirma. Que seria feito da justiça, se esta proferisse as suas sentenças baseando-se em afirmações anônimas, afirmações que se recusem a enfrentar a clareza de testemunhos públicos e contrários?

Eis porque a Direção Geral dos Capelães proíbe a todos os capelães de Penitenciária que deem testemunho perante a justiça, sob qualquer pretexto que seja.

O Capelão-Chefe das Penitenciárias (a) Mons. Jean Bódhaln».

O documento, sendo assaz claro, dispensa comentários.

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