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Por que os católicos cultuam relíquias?

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O culto das relíquias (que não é adoração, mas veneração) brota espontaneamente dos sentimentos humanos. Toda família respeita os despojos mortais e os pertences de seus ancestrais. Como se compreende, houve enganos e abusos no tocante às relíquias, a Igreja os coíbe.

As relíquias: noção

Relíquia é um fragmento de osso ou um objeto que tenha alguma relação com a ossatura de um(a) Santo(a). Os fiéis católicos lhe prestam veneração ou reverência. Tal atitude é espontânea ao ser humano; toda família costuma guardar com grande estima os pertences de seus antepassados, como, por exemplo, o terço da vovó, o missal do vovô ao fazer a Primeira Comunhão.

Tal atitude é tão natural que se encontra também fora do Catolicismo. Assim os muçulmanos guardam na mesquita de El Jazzar em Akko (Israel) alguns pelos da barba de Maomé, que todos os anos são apresentados aos devotos durante o mês do Ramada. É de notar também o fato de que em 1988 as autoridades soviéticas (comunistas), para comemorar o aniversário do Batismo da Rússia, devolveram ao Patriarca de Moscou as relíquias conservadas no Kremlin.

Na Igreja Católica a veneração de relíquias está muito difundida, especialmente na piedade popular; cabe às autoridades eclesiásticas vigiar para que não se confundam verdadeiras e falsas relíquias.

Notas históricas

No Império Romano estava em vigor uma iei que proibia esquartejar os cadáveres. Todavia era observada somente em Roma; fora da capital as autoridades e o povo cediam ao desejo de possuir um fragmento do cadáver de um Santo; os próprios Imperadores bizantinos violavam a lei, desejosos de colocar relíquias nas igrejas por eles construídas. Assim se explica a multiplicidade de relíquias de Santos espalhadas pelo mundo cristão.

Primeiramente os mártires foram cultuados; sua coragem perseverante valia-lhes a estima do povo de Deus, que recolhia seus despojos e os sepultava com reverência. As sepulturas dos mártires eram visitadas por peregrinos; havia quem desejasse ser sepultado junto a um mártir pois julgavam que este mais intercederia por tal irmão na glória do céu.

Compreende-se que a veneração das relíquias tenha dado ensejo a falsas concepções em certos casos; houve quem lhes atribuísse poderes mágicos ou quem considerasse autêntica uma falsa relíquia. Os cruzados, ao voltar do Oriente traziam consigo “maravilhosas relíquias”, cuja genuinidade não era comprovada; assim, por exemplo, segundo os Evangelhos apócrifos, Maria Virgem terá deixado ao Apóstolo Tomé, como testemunho da sua assunção aos céus, um véu da cabeça de Maria SSma.

Os abusos provocaram a rejeição das relíquias por parte do protestantismo, ao que o Concílio de Trento respondeu nos seguintes termos:

“Ensinem os Bispos diligentemente que devem ser venerados pelos fiéis os sagrados corpos dos santos mártires e dos outros que vivem com Cristo, [corpos] que foram membros vivos de Cristo e templos do Espírito Santo (cf. 1Cor 3, 16; 6, 15.17.19; 2Cor 6, 16) e que por Ele hão de ser ressuscitados para a vida eterna e glorificados e pelos quais concede Deus aos homens muitos benefícios. Por isso, aqueles que afirmam que às relíquias dos santos não se deve prestar veneração e honra, ou que elas e outros sagrados restos mortais são inutilmente venerados pelos fiéis, ou que em vão se cultua a memória deles para lhes pedir ajuda: [aqueles que tais coisas afirmam] devem ser de todo condenados, como já antigamente os condenou e agora também os condena a Igreja” .

(Collantes, FC n° 7255)

Em 1587 o Papa Sixto V confiou o controle do culto das relíquias a chamada “Congregação dos Ritos”, que em 1969 o passou à Congregação para as Causas dos Santos.

Depois que um servo de Deus é beatificado, é lícito expor suas relíquias à veneração dos fiéis; até data recente também era permitido retirar parcelas dessas relíquias e distribuí-las a quem as desejasse. Tal prática atualmente é desaconselhada.

Mais importantes do que as relíquias dos Santos são aquelas que presumidamente dizem respeito ao Senhor Jesus. Algumas são conhecidas e veneradas desde o século IV; outras foram trazidas para o Ocidente pelos Cruzados no século XII (sem sólida documentação que as autenticasse). São as seguintes:

1) O lenho da Cruz de Cristo, a principal relíquia. Pode-se crer que em 348 havia em Jerusalém ao menos um grande fragmento da Santa Cruz, como atesta o Bispo local São Cirilo em suas Catequeses Batismais (4,10; 10,19; 13,4): “Até a presente data pode ser visto entre nós… mas, em virtude dos extratos que a fé multiplicou, foi distribuído em pequenos fragmentos por toda a terra”.

É certo que Santa Helena, mãe do Imperador Constantino, depositou um pedaço relativamente grande da Cruz em seu palácio Sessorianum, que veio a ser posteriormente a basílica da Santa Cruz em Roma. É desse fragmento grande que provavelmente se derivam os pedacinhos da Cruz existentes na basílica do Latrão e no Vaticano.

Em Paris o rei Qcldeberto mandou construir a basílica da Santa Cruz para acolher um fragmento da mesma, local hoje dito “Saint-Germain-des-Prés”. Pouco depois Santa Radegunda recebia em Poitiers (França) a relíquia da Cruz que o Imperador bizantino Justino II lhe enviava (569).

2) Entre as outras relíquias da Paixão, algumas são atestadas desde os séculos V/Vl, como o título da Cruz de Cristo, a coluna da flagelação, a coroa de espinhos e os cravos, que várias comunidades reivindicaram para si.

3) A Escada Santa ou escada do palácio de Pilatos em Jerusalém, acha-se perto da basílica do Latrão, mas é comprovadamente uma falsa relíquia.

4) Na basílica do Latrão em Roma encontra-se a presumida mesa da última Ceia do Senhor.

5) O Santo Sudário de Turim polariza toda a atenção outrora prestada a outros sudários visitados por peregrinos, como o de Cadoum (França). É tido como autêntico por pesquisadores de renome, mas tornou-se misterioso porque recentemente os estudiosos descobriram um segundo rosto no santo lençol. Com efeito, o Prof. Giulio Fanti, da Universidade de Pádua (Itália), acredita ter visto uma imagem fraca em fotografias de seu projeto e resolveu estudar mais a fundo o problema, sem deixar de professar, até novas descobertas, a genuinidade do Santo Sudário.

6) O presépio de Jesus em Belém era conhecido pelos cristãos do século III, como testemunha Orígenes falecido em 250: ver Contra Celsum 1.31. A partir do século VII só existem fragmentos, dos quais os mais notáveis são os da basílica de Santa Maria Maior em Roma.

7) A Casa Santa, tida como transferida pelos anjos de Nazaré para Loreto (Itália) em 1298 é considerada espúria.

Conclusão

Como diz S. Agostinho, os corpos dos Santos são instrumentos dos quais se serve o Espírito Santo para realizar suas obras. Por isto os seus despojos mortais são honrados desde o início da Igreja. As Atas do Martírio de S. Policarpo (+ 156) referem que, após a morte do mártir entregue ao fogo pelos perseguidores, os fiéis foram recolher as suas cinzas.

Esta reverência recomenda que os cadáveres sejam sepultados, seguindo o curso natural das coisas, e não cremados. Nos séculos XVIII a XX a Igreja se opôs formalmente à cremação, porque a Maçonaria a propugnava para afirmar que o cadáver humano é lixo e deve ser tratado como lixo; a partir de 1964 a Igreja aceita a incineração, porque razões de urbanismo, higiene, economia… a podem recomendar índependentemente de qualquer concepção filosófica materialista. Está a critério de cada fiel católico escolher o destino a ser dado aos seus despojos mortais.

Os católicos veneram os Santos e suas relíquias, não os adoram. Há, porém, quem observe que segundo o Dicionário, venerar e adorar são a mesma coisa. Respondemos que venerar e adorar são duas atitudes íntimas ou da mente, que o Dicionário é incapaz de penetrar e qualificar. Com efeito, adorar não é simplesmente ajoelhar-se, mas é reconhecer no fundo do coração a soberania absoluta de um ser – o que só toca a Deus, o único Ser Absoluto. Venerar é reverenciar, respeitar, homenagear. O Brasil pára no dia 21 de abril não para adorar, mas para honrar e reverenciar Tiradentes. Não vale, pois, a palavra do Dicionário no caso.

A veneração das relíquias é algo tão natural e espontâneo que antecede qualquer concepção mitológica ou cristã. Os pagãos podem praticá-la dentro de uma mentalidade politeísta; que lhes inspira o culto. Os cristãos a praticam dentro de uma mentalidade monoteísta; a estes será sempre necessário acautelar-se contra qualquer vestígio de superstição; ou magia, só Deus opera milagres… muitas vezes por intercessão dos Santos cujas relíquias são veneradas.

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